Os dias são longos demais para mim, são demasiado duradouros para os poder ocupar totalmente sem nenhum minuto de fora. Se deixo escapar esse minuto, sei que me irá custar minutos a mais do que aqueles que tenho para gastar no todo. Quero, então, pedir tempo. Tempo para ocupar o tempo, para guardar o tempo que me sobra. Pedir muito? É pedir paz.
O fim parece próximo, demasiado próximo até...

Sou nada

Sou nada.
Escondo-me com múltiplas capas que vão caindo e me vão mostrando, quem realmente sou. Sou nada. Espanto-me todos os dias comigo própria, descubro algo que nunca pensei ser ou então, algo que pensei mas que não queria ser e recusava aceitar o ser: ser nada.
Vomito actos de outras pessoas. Habituo-me aos vícios dos outros e ganho-os sem desejar. Como se comesse partes e gestos que acabam por aparecer, sem vergonha, na minha pele. Mas pergunto-me: não somos todos assim? Em parte, canibais?
No entanto, não consigo descobrir onde ficam os meus gestos, as minhas expressões, os meus hábitos no meio dos intrusos no meu sistema. Talvez por os fazer, ter, ou dizer constantemente, não os note; porém, sinto falta do "Eu", sinto falta do "Ser", sinto falta de querer ser quem sou. Pois neste momento sou nada, e o ser nada não estou a aceitar.
  O Sol foi-se? Já? Foi tão rápido... Não pode ter sido assim tão veloz, tão pouco, tão... passageiro! Quero receber a tua luz durante mais tempo, infinitamente! Mesmo que não haja Lua não me importo, pois o meu objectivo é ter-te sempre, meu Sol.
  Acomodei-me a ver-te todos os dias a iluminar-me o dia, como luz de presença durante a noite; e raramente falhaste, a não ser quando as malditas nuvens revolviam aparecer e dar o seu lugar na acção: na nossa acção, que levaram incondicionalmente (e apesar da nossa contrariedade) a um escuro dia (...).
  Revoltemos-nos! Não vamos aceitar isso, ser magnífico. Vamos levantar a cabeça e fazer frente a meras nuvens, que não passam de, pequenitas barreiras no nosso caminho. Nós somos maiores, mais altos, e temos força para as afugentar, não tenho dúvidas...
  Brilha. Brilha, que eu vou estar sempre, algures, a ver-te brilhar.

Todos olham mas nenhum deles vê

Digamos que nem sempre a vida corre como nós queremos e, numa maneira de libertar emoções: choramos. Choramos porque não nos conseguimos conter por dentro, porque aquela dor não é nossa e não sabemos então, lidar com ela. Alguns choram, outros isolam-se e outros fogem. O ser humano é tão complexo e tão simples...
Deus não criou tudo ao acaso (ou para aqueles que não acreditam: alguma identidade ou fenómeno). Se existem sardinhas em grande número, foi porque o número de pessoas do povo assim também o era. Se existem emoções menos boas é por alguma razão. Razão no entanto desconhecida. Porém existem, e temos de lidar com elas. Algumas pessoas dizem que é para nos enriquecer enquanto seres humanos, isto é, estarmos preparados para o que vier. A dor que vamos sentindo é uma antecipação, uma amostra do que no fim vai acabar connosco. Seja como for, a nossa vida será sempre mais uma no meio de tantas outras.
Se nós em certas ocasiões nos perguntamos "Porquê?" de algo acontecer e que não estávamos à espera; porque é que em momentos da nossa vida criamos uma espécie de muro, escudo protector em relação a nós mesmos? Entristecemo-nos por motivo algum mas que não tem significado. Tanto reclamamos por perdas da vida; e por ocasiões diversas perdemo-nos do mundo e de nós mesmos. Somos uns tontos vagabundos no mundo.

O céu não é azul, nunca o foi...

As folhas são verdes, amarelas, castanhas, vermelhas e outras vezes cinzas. E porque, tu, meu lindo céu, és sempre azul? Azul da cor do mar, azul escuro, enfim... azul! Já te vi cinzento, e não gosto de te ver assim. Não é a tua cor habitual! Ficas bem de azul, que mais te posso dizer?
Adoro quando de manhã acordo e te misturas com o sol. Simplesmente, adoro. Ficas: laranja de vergonha, cor de rosa quando estás com calor, e roxo quando não te queres misturar muito. Afinal, tens esse direito! Gosto de ver limpo, sem nuvens (a verdade é que não gosto de chuva, pelo menos em demasia). Porém, gosto de ver como tu, as nuvens e o sol se misturam em ti mesmo. Ninguém te dá importância céu, vamos reconhecer isso. Todos te consideram azul. E daí não passas...
Vejo-te todos os dias com olhos de ver, e digo-te: és uma completa fonte de cores, tal e qual um arco-íris. Não és o simples azul que toda a gente diz que és. És mais que isso! Só não és exibicionista (...)

 (Fotografia: Maria Antunes)
(Fotografia: Maria Antunes)